quinta-feira, 24 de maio de 2012

Movimento Imóvel


Mais uma vez encontro-me aqui, estática, tentando transparecer uma calma que não é minha para sei lá quem, sei lá por quê. Simulo que sigo em frente, caminhando, mas todos enxergam que meus passos não avançaram. Entretanto, persisto negando. Estou caminhando, não veem?

Transformo-me em esteira ambulante, dando passos no ar fingindo que vou a algum lugar. Permaneço. É apenas uma tentativa carente de calar as pequenas demonstrações de fraqueza que vazam de meus olhos gritando o quanto ainda estou, lembrando o quanto ainda não fui.

Furto-me de mim mesma, escondo-me do que sou e fujo do externo, concentrando-me num espectro arquivado na gaveta mais escondida do que significo. Esqueço seu número. Esqueço sua pasta. Não quero mais aquele conteúdo.

Nada mais é concreto em mim. Apenas sinto, sobreposse, partículas sobreviventes gritantes, de um ser que não é mais, que estancaram num implorar por descanso. Aflição aguda.

Perdi tudo que tinha e não tinha nada. Transmudei-me em um número negativo cercado de tantos positivos. Descolori-me em plena metade do caminho no arco-íris brilhante. Um nada no meio de tudo. Sou o que ficou para trás perdida num tanto faz que cansou, cedeu. Pois nesse tudo, que é mundo, nunca houve espaço para o meu nada.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Doce cheiro findado


O idealizado, quase utópico, converteu-se em físico, real. Agora, sinto o gosto que se alterna entre amargo e doce frequentemente. Posso tocar; sei de cor sua forma. Posso ver; e mesmo de olhos fechados sei cada detalhe.

Quis muito conhecer. Não quero mais saber.

Perco-me num viver desenfreado. Minhas pernas correm rápido demais, além do que meu fôlego pode aguentar. O tempo, acelerado, trata de cumprir seu trabalho e vem sempre me recordar de que tudo isso é demasiadamente fugaz.

Espero que passe logo.

Neste exato momento, concentro-me num aceitar enquanto minhas lembranças vagam em cada partícula deixada num tempo que se fez palavra. Guardo-me em textos perdidos. Guardo cada saudade entre as muitas vírgulas que compõem minhas orações.

Não há nada a fazer.

A realidade me abraça, sussurra em meu ouvido qualquer coisa para lembrar que está presente. Pede-me para voltar dos devaneios, mas que faço eu se tudo que quero é ter um segundo de volta?

Sonho. Sonho sempre.

Sonho o tempo inteiro numa volta que não volta, que não vai. Paro entre as nuvens do céu que mantenho em minha cabeça, já que dele não posso sair, e torço para que o passado voe alto e me alcance.

Voa.

De nada adianta. O que tenho nas mãos é apenas um punhado de ingredientes para fazer dessa mistura estranha algo bom. Não que ela esteja ruim, mas, sabe, lembrar do gosto doce natural de um passado próximo gera a pergunta de o que faço com essa artificialidade toda.

Gotas de essência artificial.

Sinto a forma da realidade entre os toques de meus dedos. Seu olhar pesa sobre mim. Encontro-me entre frases arrependidas de algo que queria longe e hoje imploro para ter por perto. Sinto um cheiro bom no ar, mas é apenas o sono chegando avisando que hoje será uma noite repleta do deixado.

Vive, sobrevive. Esquece.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Renascer na palavra


Não diga o que já foi dito. Não tira mais uma vez do mundo o que tantas vezes foi repetido. Silencie se quiseres apenas mexer os lábios com letras usadas. Não há necessidade alguma de expelir o que já foi gritado. Melhor parar por aí, pois de nada adianta tentar marcar passo em pegadas já feitas.

Anda por novos caminhos, cria um novo dicionário, mas não te repitas, não me sigas, te reinventa. Sabes o quanto é vergonhoso abrir um sorriso já sorrido? Então, pelo menos dessa vez, abra apenas um olhar de canto, que diga tudo o que queres dizer, que ria toda tua felicidade. Só não clicheriza o belo, mesmo tal ato sendo cometido por tantos descerebrados.

Voa alto, para um lugar que nunca tenham chegado antes, e então manda notícias lá de cima, contando o hodierno ou, no mais, o horizonte. Inova, renova envolta de palavras à prova. Só não me chegue com um vocabulário repleto de rugas. Nada mais excêntrico do que o nascer. 

Colecionador de sorrisos


― Que escondes tu neste silêncio ensurdecedor?
― Não estou em silêncio...
― Sim, tu estás. Falas, falas, mas não dizes nada.
― Que queres que eu diga?
― Digas o que sentes.
― Não sinto nada.
― Como podes dizer isto? Em que escuridão enfiaste o que tens por dentro?
― Não enfiei. Tudo desapareceu sem meu consentimento.
― E por que não resgatas?
― Pensas que já não tentei?
― E continuas?
― O quê?
― Continuas tentando?
― Desisti.
― Por isso essa face tão vazia, cabisbaixa, apática...
― Não tenho motivos para sorrir.
― Exatamente.
―...
― Procure um.
― Queres que eu repita tudo que falei? Já disse, já disse. Eu tentei. Não consegui.
― Onde estão teus sentimentos? Onde disseste que estavam?
― Afogaram-se.
― Pois te jogas no mar, oceano, rio, seja lá o que for.
― Não sei nadar.
― Aprende.
― Não tenho tempo para perder com essas coisas.
― E o tempo que tens, vais gastar com o quê?
― Não sei... Qualquer coisa.
― Qualquer coisa... E vais sentir algo com qualquer coisa?
― Não sinto, já disse.
― Então o que custa perder tempo para sentir algo?
― Custa tempo.
― Tempo que tu vais perder fazendo coisas que nem lembrarás no dia seguinte. Tempo que tu vais perder com coisas insignificantes enquanto podia estar alcançando emoções.
― Não tenho mais força para nadar, correr, para todas essas coisas...
― Bobagem. No máximo, tu sentirás dor, o que já é alguma coisa. Vá.
― Não irei.
― Qual a desculpa agora?
― Estou...
― Estás o quê?
―...
― Medo?
― Sim...
― Queres companhia?
―...
― Vamos. Irei contigo. Estou em busca de sorrisos.
― Sorrisos?
― Sim, sim... Tu encontras a felicidade que procuras, eu coleciono sorrisos. Vamos logo.
― Calma... Deixa-me respirar um pouco. Preciso de coragem.
― Já disse que não tens nada a perder...
― E meu tempo?
― Esquece teu tempo. Pensa no tempo da felicidade, que passou tantas horas a te esperar.
―...
― Por que estás rindo?
― Não sei... Por um momento pareceu-me que ela já havia me encontrado.

sábado, 12 de maio de 2012

Paternas Cantiones


Hoje, só hoje, entendo os dizeres dos distantes. Compreendo o montante de palavras que ouvi, mas não escutei. O tal do “tu ainda vais sentir falta”. “Falta de quê? De brigas? Só nos teus sonhos!”. Não acreditei, nem mesmo pensei. Não existia a possibilidade de pelo menos cogitar sobre a saudade, pois esta não existe sem distância – não propriamente a física, mas qualquer distância, mesmo a psicológica. Tu estavas presente demais, furando todos os meus espaços e compartilhando comigo qualquer resquício de ar. Não pude perceber. Não conhecia a vida sem esse repartimento do respirar.

Hoje, só hoje, sinto tua ausência. Entre os muitos quilômetros que nos separam, sinto falta do teu chegar ao fim da tarde e do teu dedilhar alto na madeira, avisando tua entrada, enquanto teu olhar fixo me encontrava e calava – não dizia nada, mas, ao mesmo tempo, dizia tudo. Sinto falta do teu parar no pé da minha porta, analisando sei lá o quê, mas sabia. Sinto falta do almoço barulhento com conversas sem sentido entre nós. Sinto, até mesmo, falta dos dias em que tu chegavas meio sem jeito me pedindo para pintar teu rosto, pois não conseguias, de jeito algum, entender como eu fazia tão bem aquilo, segundo teus gostos.

Hoje, só hoje, posso ver claramente o espaço vago que é teu, somente teu, e está vazio, aqui perto de mim, apesar de estar tão cheio psicologicamente, pois tu nunca me deixaste sozinha. Estiveste sempre presente, ainda que ausente. Ouvir tua voz nunca me foi tão necessário. Se for apenas isso que posso ter por agora, que seja! E que tua voz me seja suficiente no dia a dia, que ela me abrace e me acompanhe no lugar do teu abraço que me foge. Que nossos diálogos diários se convertam em calor teu, em companhia física tua. E assim será.

Agora, só agora, encontro-me entre muitas lágrimas recordando muitos momentos vividos contigo. Não foi um tempo, muito tempo, uma vida... Foi apenas a minha vida toda, claro. Tu és tão parte de mim quanto eu mesma. Como te disse uma vez, “Filii canunt paternas cantiones”. Fruto de ti, canto apenas aquilo que me ensinaste. Não sou além do que o que tu me fizeste, afora algumas adaptações de um ser independente.  Sou um pouco tu, um pouco eu, um pouco nós. Não sou fruto do amor entre um homem e uma mulher, mas fruto de um amor entre duas mulheres – nós duas.

Então termino aqui, convertendo saudade em caracteres, transformando amor numa simples carta on-line, que é me possível agora. E sobre a vida, que me impede de te encontrar e desejar o melhor dia das mães de todos, sou agradecida. Agradeço a ela, por me ter presenteado a que mais me faz feliz. Eu não te trocaria por nada neste mundo! Tu és a melhor coisa que possuo. Obrigada por ter me dado existência, pois graças a ela te tenho, te vivo. Tu és tudo, simplesmente tudo. Há tanto amor aqui, em mim, que não estou mais me cabendo. É tudo teu. 

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Escre(vi)ver


Há muito, parei de escrever. Parei de tentar dicionarizar uma respiração longa, um bambear de pernas sem sentido. Parei de colocar em letras o que tinha dentro, diluído em sangue, numa contração de músculos, num cair de água salgada por um olhar cabisbaixo. Parei de tentar eternizar no papel um sentimento que passa, de tentar revelar o negativo e deixar fotografado tudo que rodou por órgãos internos e externos, a cada abraço avulso, a cada digital alheia fixada em mim. Parei de romancear a vida, tão idealizada, tão abobalhada pela humanidade
Estanquei numa inércia de sentidos e simplesmente me deixei levar pelo silêncio, pela falta de palavras. Entretanto, sempre que meus olhos paravam diante de letras postas no lugar correto por algum escritor desconhecido, o palpitar de meu coração falhava, apertava. Eles continuavam vivos e eu, não mais. 

Fazia falta poder voar entre parágrafos, sonhar entre pontuações, viver entre vidas de outrem escorridas no papel. Fazia falta ter tanta liberdade em tão pouco espaço. Escrever é pensar. E pensar é inteligenciar-se. É um receber mútuo, uma troca de dentro para fora sem paradas. Um prender-se em si mesmo, transcorrer por suas próprias veias e depois extrair para o mundo, mesmo que seu mundo seja apenas um objeto branco repleto de marcas suas, cicatrizes suas convertidas num alfabeto pueril.  

Por isso, hoje voo. Liberto-me e me permito voltar a ser, voltar a pensar, pois são frases que respiro. É no parar do diálogo que sinto minha existência crua. Nessa hora, percebo o viver. É nessa hora que ele passa bem diante de mim. 
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